Para falar da construção de uma nova cidade é importante entender o que está acontecendo no momento atual em relação à pandemia da Covid19, que por sua vez, tem escancarado cada vez mais as desigualdades sociais, trazendo consequências ainda mais graves para quem já se encontra em situação vulnerável na cidade.
Embora as cidades estejam cada vez mais modernas e equipadas, o contraste com a precarização da vida da maioria das pessoas é cada vez maior. Importante também pontuar que as cidades possuem características e significados próprios, e que estão sempre passando por transformações que refletem as modernizações e as necessidades da sociedade no tempo e no espaço. O modelo de desenvolvimento agrário que provocou o processo da urbanização, os interesses do capital imobiliário, os valores hegemônicos da sociedade que controlam o Estado e as resistências populares por melhores condições de vida são partes determinantes da realidade urbana.
Ciente de tudo isso, ao pensar na construção de uma nova cidade, transformando a que já existe, buscamos respostas para algumas questões, bem como, o que é a cidade? O que se quer transformar? E como deve ser a cidade que queremos? As respostas para tais perguntas conduzem a uma reflexão sobre o direito à cidade. Historicamente, é possível pensar na formação das cidades a partir do êxodo rural, do conceito dela como espaço de moradia, de convivência, de trabalho e etc. Além, é claro, de pensar nela com novos contornos comunitários, dentro de um modelo que induz à individualização dos sujeitos.
Ao voltar o olhar para a história de lutas por melhores condições de vida na cidade, fica evidente a importância que tiveram as organizações populares nos processos de mudança das cidades. Organizações que, em considerável parte dos casos, tiveram origem nas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), inseridas nos territórios populares e que, em torno dessas lutas por conquistas concretas, foram construindo pautas em torno do direito à cidade. Vale reforçar que as lutas eram pautadas por problemas pontuais, como asfaltamento de ruas; construção de postos de saúde, hospitais, escolas e creches para as crianças etc. Se junta a essas demandas a agenda de luta urbana para solidariedade e direitos dos mais pobres. Esta agenda pelo direito à cidade, sempre se deu em correlação de forças extremamente desiguais, com pouca incidência política do Estado nas decisões sobre as cidades, exceto em períodos de governos democráticos.
Com foco também na necessidade de construir uma agenda para as cidades brasileiras, surgiu o Projeto Brasil Cidades (BrCidades), uma ampla rede de ação coletiva, que agrega pesquisadores, lideranças de movimentos populares, profissionais de diversas áreas dos setores públicos e privados, juventude, população negra, movimentos de lutas de gênero, coletivos LGBT’s, na busca de construir cidades mais justas, mais solidárias, economicamente dinâmicas e ambientalmente sustentáveis.
Imerso a essa reflexão sobre a construção de uma nova cidade, solidária e comprometida com os mais pobres, a BrCidades apresenta uma agenda para as cidades brasileiras com referências a serem adequadas e complementadas, conforme realidades locais. A agenda é composta por muitos itens, que enfatizam, por exemplo, a defesa da função social da terra; o combate ao abandono e invisibilidade das periferias e favelas; a luta contra o racismo, o acesso universal à moradia digna e a defesa do meio ambiente como bem comum.