É impossível pensar na Covid-19, e na crise sanitária que vivemos, sem refletir sobre o tema ambiental. As condições de vida, produção e consumo atuais reúnem as condições perfeitas para a dispersão e contágio de doenças infecciosas e para a ocorrência de pandemias. Isto inclui, especialmente, os níveis de desmatamento das florestas e a proximidade da produção de carnes para o consumo humano e dos aglomerados urbanos com os remanescentes florestais e as espécies silvestres. Outro ponto se trata da concentração crescente de pessoas em espaços urbanos cada vez mais densos e populosos, o que leva a existência de redes de transportes que permitem a rápida dispersão de doenças em níveis nunca antes vistos.
Diversos autores que estudam o tema entendem que a crise ambiental que vivemos é resultante desse descompasso quantitativo entre crescimento populacional e a capacidade de regeneração do ambiente. A natureza tem capacidade de se regenerar, mas essa capacidade possui um limite. Atualmente somos muitos e nossos hábitos de vida e de consumo exigem recursos demais da Terra, muito mais do que a sua capacidade de recuperação.
Tal situação nos leva a algumas perguntas: como deve se comportar o Estado ao formular políticas públicas voltadas ao meio ambiente? Qual o papel do cidadão? É possível reeducar a sociedade para um modelo sustentável de consumo? É possível reverter o atual modelo?
O sistema produtivo mundial é extremamente desigual, de modo que nem todos têm as mesmas oportunidades de uso e acesso aos bens naturais do planeta. Para os habitantes dos países do hemisfério sul alcançarem o mesmo padrão de consumo material médio de um habitante do norte, seriam necessários, pelo menos, mais dois planetas Terra.
O conceito de desenvolvimento sustentável atende às necessidades e aspirações do presente sem comprometer a possibilidade de atendê-las no futuro. Trata-se de um desafio alcançá-lo e há aspectos políticos fundamentais para isso como uma política de participação democrática. A participação popular se coloca como peça fundamental da política ambiental, indispensável para uma mudança substancial do atual quadro de políticas públicas.
A crise sanitária que vivemos demonstra que não é mais possível fugir desta problemática socioambiental e deixar de discutir a questão do consumo. Nosso modo de consumir se tornou algo tão central na nossa vida, que antes de sermos reconhecidos como cidadãos, somos consumidores.
O papa Francisco, uma das principais lideranças políticas e religiosas da atualidade, por meio da sua Encíclica Laudato Si’, denuncia de modo enfático os prejuízos socioambientais decorrentes dos atuais modos de produção e consumo. O documento defende que “a humanidade é chamada a tomar consciência da necessidade de realizar mudanças de estilo de vida, de produção e consumo”. Em outro ponto, afirma que “a Terra, nossa casa comum, parece estar se tornando mais e mais em um enorme depósito de lixo”.
Um caminho é buscar transformar os modelos de consumo nas cidades. Discutir a sustentabilidade de onde vivemos passa necessariamente pela questão da promoção da equidade e da justiça social, pela gestão urbana democrática e participativa, pela oferta de habitação digna para todos, pela gestão do saneamento, pela garantia da mobilidade sustentável e acessível para todos e pelo próprio ordenamento territorial. É necessário coragem para romper padrões e dar origem a uma nova relação com o meio ambiente.