A professora e artesã Neide Pereira, 35 anos, participa pela sexta vez do Curso de Verão. Ela não conseguia participar do curso desde a edição de 2015. Entretanto, quando finalmente chegou a vez de reencontrar pessoas queridas e matar a saudade do mutirão, deparou-se com a pandemia da Covid-19 e a necessidade de adaptar o curso ao formato online. “A gente está vivendo um ano de curso cada um no seu cantinho, mas naqueles momentos de roda de conversa, da mística, a gente está unido. Estamos separado por quilômetros, até por oceanos. Mas tem algo nos unindo”, afirma ela, que participa da roda de conversa “Ya Neide Oliveira Silva”.
Neide Pereira é apenas uma de vários cursistas que, ainda que muitas vezes inexperiente em encontros virtuais e com saudade do curso presencial, surpreendeu-se com o espaço das rodas de conversa. Ao todo, foram criadas 19 rodas para dividir os cursistas neste ano e em homenagem a diferentes personalidades: “Violeta Parra”, “Lia de Itamaraca”, “Rubem Alves”, “Leci Brandão”, “Marçal Guarani”, “Freio Domingos Savio”, “Ariano Suassuna”, “Tata Tancredo”, “Ya Neide Oliveira Silva”, “Rosa Maria Egipciana”, “Patativa do Assaré”, “Nha Chica”, “Padre Julio Lancellotti”, “Jaime Isidoro”, “Dom Aloisio Lorscheider”, “Marielle Franco”, “Ailton Krenak”, “Conceição Evaristo” e “Martinho”.
A coordenadora do Curso de Verão, Cecília Franco, conta que a ideia formulada nos encontros de voluntários que construíram o curso foi criar um espaço diferente das oficinas dos cursos presenciais. “A metodologia das oficinas é para construir, por exemplo, a dança, as artes plásticas. Isso é difícil via internet. A roda de conversa é uma partilha. Eu escuto um conteúdo e falo o que pode me trazer como projeto de vida, o que isso vai ser na minha realidade sociocultural e socioeconômica”, explica.
Contudo, a experiência nas rodas não se limitou à discussão a respeito dos temas abordados nas assessorias. A roda de conversa “Rubem Alves”, por exemplo, criada em homenagem ao educador e teológico homônimo que já dava nome à tenda “Arte e Educação Popular”, teve músicas cantadas pelos monitores e cursistas. As melodias foram interpretadas por meio de um ganzá. Como o instrumento musical foi construído a partir de copos de iogurte, foi feita uma reflexão a respeito da transformação de materiais recicláveis em material pedagógico.
Quanto às assessorias, por exemplo, as reflexões promovidas pela professora Moema Miranda no primeiro dia de curso foram transformadas em desenhos por cada cursista da roda em uma folha sulfite. Os desenhos foram enviados pelo WhatsApp ao monitor Sérgio Henrique, conhecido como “Serginho”, que colocou cada gravura na tela da sala de vídeo. Em seguida, foi dado espaço para os cursistas falarem sobre a sua pintura. “Tem sido uma experiência nova e também de muito aprendizado. A roda de conversa foi construída e pensada a partir de várias ideias e de várias mãos”, afirma Serginho.
O missionário mexicano Miguel Angel, 29 anos, um dos cursistas da roda “Rubem Alves”, conta que participou pela primeira vez do curso no ano passado. O religioso tem gostado da atual edição assim como gostou do CV 2020. “Foi uma experiência muito boa e essa experiência também online não tem sido diferente. A gente tem dificuldade de entrar em um contato mais direto (no espaço virtual), mas abre a possibilidade de pessoas de longe poderem participar”, avalia ele, que vive há dois anos na cidade de Diadema (SP).
A geógrafa Eliane Aparecida Neres, 42 anos, outra das cursistas da roda de conversa, também fala sobre o contato entre os participantes. “Como o curso presencial, tem pessoas de diferentes formações, de diferentes atividades. É uma característica do Curso de Verão. Claro que fazem muita falta os abraços, o estar próximo, conversar com o colega do lado. Por outro lado, o fato da gente poder estar junto em roda, nesse momento que a gente está recolhido, é muito positivo”, afirma.
E foi com abraços que um dos momentos da roda de conversa foi finalizado no penúltimo dia de curso. Em um dado momento, os cursistas foram convidados pelos monitores a levantarem de suas cadeiras e a fazerem alongamentos para esticar o corpo.
Os cursistas esfregaram as suas mãos para as aquecer e depois deram um abraço em si mesmos. Em seguida, passaram a imaginar que os abraços não eram mais dados em si próprios, mas em outro dos colegas da roda conforme cada nome era chamado pelos monitores.
No final da roda, todos combinaram que o dia seguinte também seria iniciado do mesmo modo. Afinal, nem o distanciamento do formato online poderia separar os abraços no Curso de Verão.