Vereadora e mártir serviu de inspiração para as discussões na oficina sobre direitos humanos e a migração
A 32ª edição do Curso de Verão, organizado pelo CESEEP (Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular), apresentou-se esse ano com uma novidade entre as suas 15 tendas (oficinas), que chamou a atenção dos cursistas.
Foi criada a tenda “Diversidade, Cidadania e Bem Viver” para a edição deste ano, que tem como patrona a vereadora pelo PSOL, Marielle Franco, assassinada em 2017 no Rio de Janeiro e que também deu nome à oficina.
“Se hoje estamos em qualquer luta, tendemos a homenagear quem também está. Ela é uma mártir, era uma pessoa da periferia e que morreu no caminho da Justiça e da Paz”, afirma Cecília Franco, coordenadora do Curso de Verão, sobre a importância da homenagem.
Marielle Franco foi eleita vereadora do Rio de Janeiro em 2016, com mais de 46 mil votos. Foi a quinta candidata mais votada no município e a segunda mulher mais votada ao cargo de vereadora em todo o país. Seu engajamento sempre foi primordialmente pelos direitos das mulheres, das comunidades e da população LGBT, mas foi assassinada a tiros em 2017. Mais de um ano depois, o crime possui indícios de caráter político, porém ainda não foi esclarecido.
“A Marielle acaba sendo uma motivação para a tenda por tudo o que ela representou e pela sua luta pelos direitos humanos”, afirma Dirceu Benincá, monitor responsável pela oficina.
Benincá conta que a ideia de oferecer a temática “Diversidade, Cidadania e Bem Viver” surgiu a partir do tema do curso, que debate a migração. “(A temática) está envolvida no processo migratório, onde há uma diversidade muito grande em termos culturais, étnicos e de religião. A cidadania é um termo que estamos utilizando para representar a luta dos migrantes e de todas as instituições que os apoiam, para conquistar a cidadania ativa deles. O bem viver tem sido utilizado muito para representar quem luta pela dignidade humana, para pensar no bem dos migrantes e no bem de todos”, explica.
A oficina tem realizado discussões com base no que é apresentado pelas assessorias do curso na parte da manhã. Os cursistas têm vivido a experiência de conhecer as dificuldades pelas quais passam os migrantes ao sair de seus países e devem deixar o prédio da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo) nesta segunda-feira (14), para fazer uma visita à Missão Paz, instituição que auxilia migrantes em São Paulo.
Fred Ngalula, 28, é um desses cursistas. Ele participa pela primeira vez do curso e está há cinco anos do Brasil. Deixou o Congo, seu país natal, como um refugiado político.
Para ele, é importante levar o tema da migração aos cursistas. “A gente se sente excluído aqui na sociedade e muitos cursistas não conheciam a situação da migração. Eles vão compartilhar essa experiência com outras pessoas para que possam ter esse entendimento”, afirma.
Ngalula diz que a homenagem a Marielle também foi importante. “Achei isso legal, homenagear uma mulher negra que estava lutando por direitos, pois nós negros aqui somos muito discriminados (aqui no Brasil). Sentimos-nos excluídos na sociedade, o Brasil não dá espaço para nós. Era uma pessoa que estava lutando por esse direito. Explicaram na tenda que ela foi assassinada e o que ela estava fazendo pela periferia”, falou.
Já Gabriele, outra cursista da tenda e que está no Curso pela primeira vez, conta que a experiência tem sido de grande fortalecimento pessoal e profissional. “Eu vejo como a sensibilização sobre a questão dos migrantes e refugiados está sendo forte. (Sobre a) percepção de todos nós como migrantes. Eu já morei em três Estados e é por causa das experiências que passei eu mudei para São Paulo, Paraná e, depois, Mato Grosso do Sul. Foi difícil me adaptar, imagina pra uma pessoa de um idioma em diferente”, reflete.
Gabriele, que é professora de História e Sociologia para adolescentes e faz parte da Pastoral da Comunicação na comunidade católica onde atua em Mogi Mirim (SP), também conta que fará questão de promover o Curso para que cada vez mais pessoas participem.
“Porque eu acho um sem-terra terrorista, porque eu só vejo vídeos sobre isso, mas eu nunca vi um sem-terra. Quando eu vou ao encontro desse sem-terra, eu vejo que ele é uma pessoa, um pai, uma mãe, um irmão e quando eu vou a essa saída, eu possibilito o diálogo e isso é necessário para a humanização da sociedade”, afirma. “O Curso de Verão é um dos principais lugares de encontro destas diferenças com o que há de diferente”, disse.
A edição deste ano conta com cerca de 500 pessoas entre cursistas, monitores, voluntários e assessores e busca fomentar e aprofundar as discussões sobre os desafios da migração no Brasil, sua dignidade e os Direitos Humanos.
Mylenna Lirio e Arthur Gandini / Comunicação / CV2019